sábado, 25 de abril de 2009

A medida do outro

























Há dias em que meu mundo não acorda mais para fora
Meu passado me presenteia e...passo
Habito extremos que nem existem
Sigo como quem perdeu a direção mais fácil
Não morro em casa
Canto antes ao olhar torto:
As pessoas são como estão...
Na rua das violetas o caminho é lilás.

Nat.

Doentes de razão


Assaltaram o que em mim dizia-se palpável
Levaram apenas a matéria do caos
É tão bom inventar tempos de nossa própria essência
A infinitude dos dilemas sorri em meus poros
O ritmo que percebo nas calçadas me diz tanto...
Onde as respostas me despertam
Dá-me Senhor um gole de tua insana lição de barro e covardia.


Nat.

Fuga ao desvario


















A verdade quer sair
Improviso verbo solto
Esbarro em linhas vasos e veias
É como se não pudesse mais abraçar a cautela
Despacho minhas palavras em cordas
Atravesso pois, as possibilidades de todas as ansias que me cercam
Ora febre oca, ora curiosa conquista.


Nat.

Campos imaginários


Norteio teu vento
Respeite pois então meu tempo
Habito neste recinto de abril
Devolvo a estima do sorriso dos sóbrios
Renovo a raiz cor
Nas cruzes de qualquer estrada
Jogo meus frutos ao mar
Abre-se então uma passagem entre os cravos
É hora de regressar.


Nat.

Infinitudes Amarelas


Estamos deitados em amarelo
Quero mais flores achadas
Fragmentos de tuas sementes alegres
Visto-me das plantas que embriagam
Só assim rego meus verbos
Atribuindo a vida
O entreabir das ilusões.


Nat.

O muro


No mesmo muro, por detrás deste preto-cinza
Ali saltam saudades
Cortam e sujam de tinta branca a calça marfim
Atrás deste muro preto e cinza
Meus olhos se enchem de concreto
E não são as paredes que ditam a subida
Há de clarear com chuva que arranha tinta
Autenticará no fino espaço de calçada e barranco:
Meus tijolos são grãos de girassóis.



Nat.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Ego





















Ele vai e volta,
Em alguns casos é companhia constante
É traiçoeiro e ilusório
É mesquinho e por vezes contagiante
Se instala em classes distintas,em seres diversos
Amante das aparências e amigo do egoísmo
Inimigo declarado de tudo quanto fosse simplicidade
Cria cascas, crescem máscaras
Perde-se o essêncial
Morte em vida a espontaneidade.


Nat.

Café de outubro


Amanhece,
o café ainda quente e forte queima a ponta da língua
O gosto remete as tardes de terça-feira
O cheiro lembra as noite divertidas de papos sem sono algum
este copo de café sob a mesa posta traz sentido a vitalidade
Era hábito rodar teus cachos enquanto nosso café aprontava
Os grãos moídos por tuas mãos
Pouco a açúcar, aguçava nosso sabor
era quente, forte e memorável
Era o caule de nosso outubro.

Nat.

Tributo a Ilha Grande


Deu-se partida no motor
Abandono do precário e previsível
Acima duas nuvens
Indo e vindo por cima do céu
Avisto Deus e seus anjos
Tocando flores a mar aberto

O mar da tarde reluz rosa
Do céu espelho azul-verde mar
Adentro seis montanhas, morros e desertos
Ilusório das nuvens que me ponho a pintar

Líquido límpido
Canto de água e sal
Criaturas residentes a nadar

Terra pouca, rochas negras
Muralha dos santos
Paz serena
Te chamo menina
Te faço cantar

És moça sortida
Beija areia mar
Reverencio tua sabedoria
Venero teu lar.

Natacia Araújo.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Confissão



















Tarde vermelha ainda sentadas
Ela confidenciou-me sopros
O sopro era brisa imutável
Soprava mansinho por dez flores do tempo
Ela, contou-me tempo presente o que pesava na junção de antes com pra sempre

Naquela noite, ela sentiu misto de receio e alívio...
A pequena saberia ver com olhos ternos seu amor?
Ela, ainda atônita caminhou fora daquela praça, passos firmes, pensares confusos...
Pés novos a sua casa, braços rumo a crias...
Sentou-se no sofá, mirou-se frente a TV que transmitia ao mundo sua ventura,
Levantou-se até a cozinha, no rádio ela era saudada por tamanha coragem,
Dentro do banheiro, viu seus olhos refletirem no espelho, olhos tão brilhantes como da primeira vez...
Que saudades ela sentiria do hoje...alforria ao seu amor!

Lhe digo então mulher amiga:
Injustiça seria não sopra-lo e bendize-lo

Bendito amor
Nascido de lascas e pureza
Um sugava ao outro
Em busca do encontro de si próprio
Bendita chama
Ardendo as dez flores do tempo
Ele, carinho nas feridas
Ela, aconchego materno
Suspeito em vão, a grandiosidade a cada encontro
O quanto cresciam eles sendo somente deles
Meus olhos minguados de outrora
Brilham a vocês e os ama também.


Natacia Araújo.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Nada existencial



















Consumiu-se rumo ao nada
Mal sabia alimentar sementes
(Nada fica após o fim?)

Ele a intrigava por tamanha inquietação existencial
Por vezes, tinha a sensação de que o homenzinho havia sido plantado sem raíz alguma
Tamanha angústia que lhe acompanhava
Brotavam de seu peito dúvidas a medida que a não coerência dos fatos esboçava rosto

Ele morria a cada resposta negada pelos céus
Definhava rumo ao fim
Entregava-se...acelerando quem sabe a resposta
Fitava meus olhos a sondar...

Jamais soube explicar-lhe o que só a fé emana:
Irmão querido... limito-me a não pingar-te das verdades que não possuo
Contudo, aproprio-me contar a ti, que viver é uma grande delícia...
A ternura de meu abraço ao ver-chorar as velhas fotos de nosso pai não faz de ti um vivo?
Rir quando o óbvio lhe agrada não é lindo?
Plantar novos dias não revigora tua alma?

O que lhe falta é tomar pra si um pouco desta loucura e brindar a contradição de quem nada pode provar
Ilusório por ilusório ópto por minha própria ilusão
Pois não nos cabe saber...
Vivo do que sinto...e para viver, os provoco, incito...

Na iminência da morte vou dribla-la até onde minhas pernas assim o quiserem
E quando dobrarem-se os joelhos, estarei na ânsia de novo feto
Pois, ainda que a existencia seja de poeira e vento, novos horizontes sempre aguardarão sopro novo...

Então, em todas as minhas vindas serei ventania, serei plena
Amarei livremente e sufocadoramente, docemente e indecentemente...amarei toda a forma de amor

Terei muitos amigos com os quais possa gargalhar
Terei pés descalços
E com eles fugirei de toda faísca de poder
Serei pequena
Serei brisa
Farei grande alegria de minha mesa
E aprenderei de meu banquete

Guarde teu segredo existencial, prometo compactuar
Prometa-me participar também desta poética farsa
Faz-me bem...
Fazes por ti também...
Jamais saciada então, irei intuir o quão passageira a vida é...
E mesmo em face do vento, não me negarei vento ser
Há de ser brisa quente borbulhando mar.


Natacia Araújo.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Mago terno




















Meu mago terno,
Braços e punhos
Criatura de manias grisalhas
Diz-me somos razão incerta
Diz-me que sou foliã imprudente
Intervalos de flor: acusa-me
Bagunço teu cotidiano
Invado tua semente
Banalizo pedestal
Faço pouco das pérolas

Rompo rasgo flor:
Me fazes tão insana quanto,
Cessa meu frescor,
Julga-me menina dos olhos teus
Planta-me nas tuas entranhas escondidas
Nasce, gera, equilíbrio do avesso
Amigo, amante
Canta no sussurro de minha idade
O desafino agreste de nossos encontros

Se te afago, terna e doce
Durmo em teu queixo sóbrio
Se te aqueço, queimo e marco
Desperto teus olhos antigos
São anos demais pra nós
Se te amo, amigo pintado
Desprendo de nós este laço
Posto que é prenda em laço-flor
Já não nos somos nossos...

Tato de nossas rugas
Abrigo de outras casas
Ainda assim amor antigo-feto
Me faço crua,
Dou-me arte pra teu estandarte
Ódio a prosear-te rimas
Sou negação do verbo
Amar-te o amor que espreitas
É negar-me vento ser.


Natacia Araújo.