quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Desengano.eu, cidade de aço
gélido te chamei de puta
a intenção e o texto a te pedir desculpas
um ponta pé na cerveja
tua feição zangada
bravos palavrões mentolados

Outra vez Maria

Prometi nunca mais me casar. Legítimos os personagens, cínicas aspas.Estático e sem honrarias. De véu e grinalda,aliança em punho. Promessas e artérias no varal vizinho, dedos calejados nos beliscões doídos da vida sem platéia.Organizei dez leis, minhas roupas e voluntariosas cicatrizes das tantas mágoas.Mão única,alívio para os pés. Meus olhos tão de perto vesguinhos no teu corpo, teu corpo envergando nos olhos, mau olhado, amuletos então Maria,quinquilharias, aço e teu adorno de pescoço serão meus braços Maria.
Acabou a folia, guarda então teus anjos de costas Maria! Que é pra agilizar o enxame de abelhas no pão que o diabo amassou, que é pra cessar fogo, permitir o digno recuo, confundir a descida das tuas rebeldes lágrimas,deixar todo esse ciúme de quarentena por falta de provas. Ódio,curto pavio, deixa tudo quieto, sensação desmemoriada. Meus cabelos alongam norte-sul em teus olhinhos vesguinhos Maria. Inventamos a vírgula atenta o pedaço solto em ascensão.
Exaustas tentativas, quis o destino estar contigo Maria.


um açoite
um assombro
a baia
a pia
a distancia entre 
os pratos sujos
e a vadia

a ponte
o sopro
a selva
e a padaria
de tanta calma
o mar inunda o quarto
 sal na língua
e uma pia cheia de mágoas
entre o copo e o cristo
há muito cuspe para pouca Maria

sábado, 17 de dezembro de 2011

Do que o velho diz


nas esquinas
a explicação...

no Rio às duas 
a marreta
os pregos
e a resolução
um café, um cigarro
parte da escória sorrindo feliz
você sabe bem
o que o velho diz
era pra ser honesto
ter filhos fortes
braços a mais para trabalhar
e ele me dizia
que era bom os tempos de lavoura
batata doce à mesa
putas escondidas em sobrados antigos
e eu a me perguntar
quem foi meu avô
fumante,formoso cristão
macumbeiro
muambeiro
e tão novo
havia uma fazenda de laranjas aqui
me dizia...
eu só via um pântano
na rua vinte e dois
as pessoas
tão cegas
tão pobres
e tão sadias
a felicidade era cúmplice
de um velho
e eu queria ser como ele um dia foi...
a rua do Ouvidor era um bar a luz de rezas
ele me dizia...
e eu rezava pra ver as putas
penas delicadas nos cabelos
cigarreiras enormes e luxuosas
e eu a fumar todo passado 
querendo ser homem negro
e mais pobre
atravessar à rua do Ouvidor e beber
com as mesmas putas dos tempos dele
 e no fim das contas 

você sabe bem o que o velho diz...



suma
saia do avesso
porque meus ponteiros
quebraram todos os relógios de bolso
da tua íris azeda
corra 
não desejo mais as pernas
nem as meias
nos fios da tua seda
feche os braços
nem o cristo do Rio
faz tua escolta
sem abraços nem afagos
vá de óculos escuros
o verde dos teus olhos
me enoja
apetece os corvos a retina
de tua mentira
suma
caia numa poça
morda a língua
e quebre o braço
queime com cigarro
as poesias
e recite
o tédio
dos teus dias
suma
nas chagas
dum leproso
na raiz fétida

da sua humanidade.

fica mais um pouco
...
meu corpo tomba
quando percebe
que o seu some
todos os versos
agora têm a cor
do teu nome
te rimo propostas
te deito
e fico de costas
te ouço 
te chupo
mordo tuas pernas
te faço um altar
fico de luto

todas as pernas
do meu mundo
correndo em sua direção.


o lençol é o chão que piso
as almofadas acalmando os cotovelos
as pernas destrancam
e a fome...
você é pão e azeite
teu veneno em meus caprichos
e a sede
tua gota é a ânsia.
da raiva peregrina ambulante nas feridas
do pó, da cegueira, dos soberbos engravatados
deposita mais um pouco da tua arrogância em minhas ruínas
e veja se a platéia estufa o peito na curva
satisfaça minhas correntes e aponte dedos em minha direção
apareça em todos os lugares e tenha oito minutos heroicos
vá depressa enquanto abaixo-me no tiroteio
tenho todo cuidado com o suor que escorre
e diminui meu tamanho
abrindo o seu mundo que agora boceja
não os culpo por toda calda espessa
tenho um buraco no asfalto
e a parte da vida que respira.

sábado, 10 de dezembro de 2011

sobre o fim

findo tuas tranças
arranjos de guerras completas
estanco os abraços
dedos calejados amputando amores agudos

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

sobre bundas, bucetas e cérebros deteriorados



na arquivologia dos cus
lixos ambulantes 
em suas calcinhas vencidas
da náusea ao náufrago
olhinhos masculinos dilatados 
urubus da suburbana razão de espalhar gozo
analfabetismo comportamental
sucumbindo as teias da feminilidade
volúpia propagando porras baratas
e raciocínios estéreis
dói-me o bom senso
neste receituário para vagabundas
o óbvio em burrice crônica
tantas bundas, tantos paus...
há mais verdades entre o céu e a terra 
do que uma puta no quarto procurando a roupa
o bicho do tempo dentro espelho
sorri baixinho com os poros fartos
da superficialidade.


divido a mesa com raposas esguias
todas famintas, saltitantes e negras
e minha dignidade estática
enrugando nos becos delgados da peste
e este muro forte 
a construir outros túmulos insólitos

minhas ditaduras
uma arma calibre trinta e oito
nós dois arredios na mesmo gaiola
um caos gestual em que
não há espaço pra curas ou vocabulários
a tua e a minha frieza derrubando
indícios da sanidade.


te tenho repúdio em casas inabitáveis
te rogo pragas
destruo suas gavetas
contorço tuas pernas
molho tuas malas
estrago teus melhores sapatos
rabisco as melhores poesias que fez
te acordo descontroladamente
invoco teus medos 
e te vejo chorar
todas marcas revoltas
toda febre que por você agora queima
...
te espero outra vez com os pés calejados de erros.



sobre o asco repentino




minha repulsa lateja em trovões rotineiros
hoje quero ser feito de ferrugem
acalmar-me diante do precipício
explodir cada osso diante do divino
e adiante, costurar os pedaços que faltam no vidro
o silencio delinquente devora
minhas putas sorrindo e agonizando
exaustão herege sob demônios disfarçados.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

... porque eu comecei a ouvir um miado de gato, um cheiro de pólvora, a tua e minha loucura integradas no caótico milagre de fechar as mãos e doar figos e folclores aos cegos pobres do bairro.
porque eu ouvi a música e esqueci de cantar junto para ser mais bonito, ser igual todo mundo e sorrir delicadamente quando dizem que sou bom...
não lembrei de agradecer o copo d´água e acender o cigarro daquela mulher de vestido parada no balcão, era pra ser mais sociável, mais humano, mas eu só disse pra tirarem a mão do meu ombro.
aquela taça não foi a primeira, eu minto também, como quando você disse que a partir daquela noite tudo seria recomeço, como se o poder de refazer o trajeto fosse nosso, você e eu na Cet-Rio controlando a multidão...
sejamos sinceros meu bem, felicidade não rima com vaidade... o retrato que você mais gosta eu fiz no photoshop, o cheiro de cigarro que você sente em mim são de dois prazerosos maços por dia, eu tenho o dobro da sua idade e daqui dois anos a impotência será iminente.
não sou moreno do sol como disse você no jantar com amigos ricos, sou negro e gosto desta cor, integre esta palavra ao seu dicionário no quesito pele não apenas quando falar do céu em dias de temporal no seu aconchegante chalé em Petrópolis.
não faço e nunca fiz a menor idéia do que seja American Depositary Receipts e os efeitos que vocês tanto falam na economia, pra mim, tanto faz desde que o preço do cigarro que eu fumo escondido de você não aumente..
não interdite meus vícios querida, prometerei não delatar sua elegante tribo em troca, de sossego.
porque o medo da realidade tímida não condiz com seus notáveis sapatos Chanel.


só mesmo a poesia
para desbravar quatro cantos duma tela
como quem viaja por cada bairro da cidade...
dois andares para ruínas
doze passos para queda
sete rotas para renascer
um abrigo antigo para felicidade.
Eu poderia ter estudado literatura, história da arte, poesia pura, poesia com feijão, jornalismo com poesia, poesia com pornografia, poesia, só poesia...
Aplico hoje, em dias de escassez de oportunidades a poesia financeira, poesia administrativa, poesia de logística, poesia sistêmica, apenas números...
Eu poderia mesmo arrancar os extremos, mas poesias sem polêmicas são apenas métricas...

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

não havia tanta neblina
ela sofria mesmo de miopia...

domingo, 6 de novembro de 2011

"poemizo"
e me aproprio de verbos inexistentes pra você
cometeria qualquer delito
nos freios infames da tua memória
sugaria a mágoa desta fuligem grosseira
estancaria teus tremores
velaria tuas pálpebras irredutíveis
até o fluir dos ponteiros
esconderia as chaves
pra nunca mais te ver sair
dum precipício atiraria fora o ego
abonaria a audácia de tentar te fazer feliz ao acordar
porque todas as tentativas são de fazer valia
a responsabilidade de ter você comigo agora
não pelo poema
mas pela inquietação que tua presença evoca
"poemizo" nosso carinho
arranco do papel
desembrulho das estrofes
os versos te encontram do outro lado da cama
agradecem a vida que os deste esta noite...
e quanto a mim
alimento as crias poéticas com banquete:
te amo.

Prosa e Poesia

A prosa


Um dia, ela nunca choveu tanto. Era como se de repente fosse amanhecer, e todas aquelas notas juntas sem som estivessem dentro de seus corpos, aonde houvesse infância e as línguas e mãos fossem criadoras inseparáveis de qualquer ilusão. Sete noites como fartos desalinhos nos mais profundos ciscos dessas carnes. Lá naquele lugar onde as pessoas engolem moedas abrindo um abismo embaixo do mundo.
Sabe-se lá se é pela esquerda que eles chegam a onde se é. E foi a partir do limbo secreto abrindo o tempo por dentro dos braços que os vitrais refletiram a palavra inaugural:


A poesia


Gavetas e escadas inundam-se do mesmo nada
Realmente acontecia... É possível transpor o minúsculo!
Como se da “Primeira ilusão” os ossos atingissem a potencia máxima
E desafiassem as origens de um ator que ascende de seu próprio palco
Confundindo a platéia com um ar que bate na cara e respira
E lá no final de nossos olhos chegava o “Teatro ilusionista”...


A ilusão sonâmbula desconhecendo suas próprias doenças
Desenvolta dos golpes de sua própria garganta...
Derretiam as intenções estrangeiras de outro país e de nosso tempo
Entramos no Deus esquecido da rua, exaustos como se dá a um “Merchan” limitado
Morre ao avesso de uma prole vulgar a poesia de coisa nenhuma
Desinibidos da realidade do “Futuro de um passado imperfeito”


Há de germinar poesias como se quer das plantas
E os verbos serão como placentas em brasa que nem a sede constrói
Tijolo por tijolo...Nos braços invisíveis “Da cartola do poeta”
E será então a poesia imortal, em fragmentos e incertezas por todos os lados
“Criadores, criações e criaturas” mergulhados no mistério de uma arte gratuita.
coleciono chagas
das brancas, amarelas e companheiras
de emboscada
das camaradas em amores-amigos-irmãos
das pretas no branco tangíveis na simplicidade da ferida
das frias quase esquecidas nos ponteiros do relógio
das mornas alimentadas a pão e água
guardo onde posso
nos bolsos, em meio as pernas e em trecho dos poemas
Lúcia dorme
enquanto seus demônios pessoais 
despertam
uma batida na janela do quarto
e quatro vezes passagem para o seol

café ruim na cama
geleia de amora 
beijos e mentiras
três chaves no cofre

telas antigas
trechos de livros ultrapassados
folhas e teclados
duas retinas cansadas

cortinas fechadas
dificuldade de enxergar
ruas e calçadas breves
um corpo caído.

Novos mapas
para cegos afoitos...
destroços intermediários
nutrem o cordão umbilical
 fluídos orgânicos
transmitem pó e fumaça dos cigarros da casa
não aspire tudo Sofia
guarde um pouco pra mais tarde
nas horas das madrugadas
em que a abstinência chegar
as cirandas de tua mirada
fincaram-se em meus esboços...
daqui em diante
terás abrigo nas dobraduras
destas paredes sólidas
não corrompidas na efemeridade
da vida
serás meu filho
a saudade procriada nas tetas
de minha escolha
ninarei tua ida
acalmarei os delitos de tua partida...
debaixo da pia arquivarei mentalmente
os itens de tua primeira necessidade
serei estéril por vontade
perpetuando tua estadia
nos naufrágios da nostalgia
é preciso tirar os sapatos
arrancar toda sujeira
morrer superficialmente
e estancar o medo.
submergir da agonia nociva
nas entrelinhas da rotina
...
editar o feio
maquiar a putrefação interna
aspirando todo amargo
até faltar sangue na saliva
catar o lixo da escória
e sus'PIRAR em meio aos grandes

adequação aos lobos
preces e sacrifícios oferecidos aos deuses humanos
sorrisos e fantoches moribundos no caos 




Apodrecer em paz
fartando-me de acasos
nos democráticos cartazes do pranto...

domingo, 17 de julho de 2011

delitos
que a mão escreve
violando meu vazio

débil este emblema
sustento o corpo
obstinadamente
catando em marcha
todos meus pedaços

meu baú ósseo
arrastando
no asfalto quente
da rua

nos membros sem/cem leis
ostento a saliva
da escória

dum golpe surdo
dói-me os aposentos
em órbita gira
teu portão,
meu parapeito
...
a geografia
destas
pernas
tem
vocação para armas



domingo, 10 de julho de 2011

Adicionar legenda
que ninguém se engane
no cair de tuas ondas,
nas brisas de tua ilha
partindo em navios de afeto...

sábado, 9 de julho de 2011


Comigo,
bentas lágrimas,
alvoroço de vida
era a página de um livro
a letra no encaixe do enredo
era Izaías
''nalguma" curva do verso
tombado nos tendões da memória

e o sonho
a voz tua que faço
teus passos vindo como presságio
o brinquedo e minhas tranças nas costas

e eu só quero ouvir tua música
o mensageiro ainda tarda
pego a senha e o santo
estendo a carcaça até a ponte
então lá vem Izaías
na mão que me lê
no fundo duma concha

as palavras do livro
em seus postos de combate
correndo até você
nos destinos de um massacre
Onze anos e teu silencio

era Izaías
minha utopia que sangra.

quarta-feira, 1 de junho de 2011


Sei das vozes a dez quilômetros da liberdade

tamborilando despudoradamente a respiração do ombro da terra

na dança, lágrimas fundas do Atlântico

amparando a solidão gestual que alcança o mundo

esta seria a hora de regressar com música aos espelhos

de agarrar o vento nas labaredas dos ouvidos

direcionar a força dos pulmões

produzir a mecânica mística dos pés

e em atrito ao solo inflamar-se e semear

as vibrações convulsivas das bandeiras que içastes.




                                                    Minha ciência dócil considera o futuro

desejando intimamente o mapa dos rumos
numa mala ou num bar de putas
nas rotas a possibilidade de avançar e acertar
na reinvenção destas minhas pobres células resistentes
levo na mala um par de calças velhas e a crença num deus
que por hora ocupa-se com o preço alto dos figos
meu itinerário se gasta no conformismo da cruz que viajo
e pelas estradas perdidas cuspia sangue em minha relva
nas madrugadas os passos muambeiros das raparigas dos brincos de lata
e do asfalto o sangue negro que não estanca
saio de minhas fontes rondando de perto à noite atenuada na medida dos erros
o novo sentido é uma queda avisada por música
uma tenda dispersa que venho habitar.

O choro dos secos
ditará a sentença dos náufragos imorais
como este barco rompendo os contornos das espumas
e na espera do cansaço sacio a sede em meio a caixas de lixo

exilado na habitual deglutição das cordas da garganta
banharei-me num alambique
ali, os pesadelos serão os clandestinos embaciados...
cambalearei no leito das manchas da renúncia
e nua, tatuarei na púbis o que o mar me nega

pelos seios, serei pescada nas redes da fúria
pela estupidez farei dum anzol a forca da cópula
na secura que um dia me afogastes.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Meu paraíso liquido começa
seguindo as íntimas vestes que as pálpebras produzem
e da água ao naufrágio de ontem
meus peixes amadurecerão na mesa

e as paredes recém pintadas indagarão o mundo
nas cavidades ocultas das cortinas...
meus cadernos fervilharão numa lista
onde não lerão apenas poemas
terei o desejo sucumbido da infância
de declamar os mantimentos da dispensa

em minha casa de estruturas brandas
a felicidade reaparece em meio a desordem
de uma cozinha
e do fogão aprendo o alfabeto ritual de nossa ceia
em fogueiras nômades do paladar aquático da boca

pouco importando de qual lama antiga emergimos
se ficamos em uma casa ou numa tenda
se nossos ossos amparados criam a cicatriz da montanha vertebrada
de nosso sossego.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Regresso do ângulo de um berço
quase sucumbido na ditadura
de meus arquivos neurais,
percorri toda casa
até reencontrar meu pedaço vital

fiz ressurgir de meus escombros
a textura apertada que captura sonhos
e frente minhas ilhas amargas
quebrei lentamente os conta gotas

devolvo-me levando as chagas dum mendigo
com bofetadas recebidas
na nostalgia sem esboço

preparo-me enquanto renovam-se os ponteiros
na caduquice paralítica...

dos antigos tempos sem destinatário.

sábado, 26 de março de 2011

Malaguetas

Meus gatinhos são malaguetas
despidos todos chegam ao se brotar
cintilam em suas carinhas inocência de vida
da alquimia do que todos fomos
atrevidos já estragaram-nos roupas e sofás
no bosque elétrico de suas curiosas percepções
e abancada em familiar paisagem
observo com amor
o júbilo igual de todos os dias
pois essa emoção de vida
ocorre em nós apenas
nas primeiras manhãs da infância.

Copo

No meu copo
ritos de batismo
donde a língua navegante
deixa a cada porto
anticorpos nas sacolas
e o álcool a adentrar pelos vasos
trepida a sobriedade
no ponto de mira

Não há alvos perfeitos
nem pretensa cifra emboscada
apenas o copo em que o líquido é o projeto
da embriaguez que por hora é a obra

As pernas entesouradas
os documentos debaixo do braço
e os sentidos reproduzindo sistematicamente
as curvas das ruas de asfalto
o copo unido a boca em suas proporções
tão cheio de argumentos como um deus extinto

E como pode tão frágil objeto
ter tantos exércitos líquidos enterrados?

No vidro aprecio o gosto da carícia
o dedo firme a explorar seu veneno
da língua no copo a deriva.

Metalinguagem

O verbo tem sua meta
explorar seu eco estético

Já a palavra despojada,
desvencilha-se da convenção estúpida

A semântica para a estrofe
é uma prostituta gorda

onde a hermética com seu falso reino letal
é uma velha de cachimbo

E na metalinguagem de meus esboços precários
tampouco as sílabas, errantes peregrinas
caem nas babas de poetas covardes.

Slogan

Deixa que os mesquinhos
e suas pautas sem significados
indaguem-nos com suas línguas de carniça
deixa que a desordem será nosso reencontro

Deixa que estas mãos façam o trabalho sujo
e surpreendamos as sentinelas
abrigadas nas janelas de suas gargantas de aço
deixa nossa vulgaridade como slogan
é nossa máscara ardendo nesta batalha que não cessa...
Deixa.

Hino ao Carvão

Aquela mulher de asas gigantes
puríssima senhora
abraçada a timidez dos tempos idos de seu violão
cujos vestidos agrestes causam chuvas elétricas nos pulmões
que na guerra dos cínicos é um anjo
com seus hábitos e passos firmes
reservando seus fastasmas nos sopros
dos seus artesanatos de tricô
a mãe de meu pai que atravessa a fronteira cinza
e num amor perdido de setembro o abraça e resgata
por isso a fera de sua moral de tão terna faz parecer inventada
cantarolando pelos cômodos as mais queridas canções populares
carregando o próprio céu em seu rosto
E vai marchando em suas antigas fotografias
a reencarnação das mínimas lendas de um dia
fazer de seu caderno escolar aulas orgulhosas de carvão e pedra
retornando um dia inteiro suas recordações magníficas de Campos dos Goytacazes
nas mãos transbordantes de alegria roubar da infância maçãs vizinhas
naquele mesmo tempo em que panelas transbordavam de sopa e legumes
E cá fora ainda hoje, basta ver teus olhinhos míudos
para ver mais de perto aquela terra fresca

Um dia, acredita do alto de sua autoridade sábia
que pessoas se cumprimentarão apenas com sorrisos
e as cartas todas serão novamente escritas com as mãos.

Agradável Existência

Em meu ventre teu cárcere sem saídas
onde tu pequenino encaixa-se
com seu sorriso de agradável existência
e nas cores a bandeira
em que minha silhueta desaparece mês a mês na tua mirada
assim incubo tua carne
num lance inédito a se infiltrar em meu vazio
alimentando-se ansiosa nas asas noivas de tua chegada
meu útero vai desafiando os lamentos de um leproso
e na grandeza de minhas árvores
conto agora as folhas amarelas da fertilidade de meu vale
e do que em ti, em mim detenho...
vou determinando a todas minhas células finitas
tua consciência úmida de vida
e nos vilarejos de meu planeta
a revolução progressiva de meus desfiladeiros
porque agora adubarei tuas raízes mais profundas
como quem espera das outras páginas de livros
o motor ligado deste primogênito que chora agora.

No Escritório do Cristo

Minhas repetições escassas
e já sou convertido
trabalhando num velho escritório
a aparência fria do cristo

e das bíblias penduradas na parede
sangram e murmuram teias de aranha
nas mãos dos funcionários rosários miseravelmente viscosos
a contrapor a reza dos cristo em seus membros de porra

Nossa fé cambaleia, portanto nesta espécie de suicídio...
com uma mão suplicamos
e com a outra masturbamo-nos
imbuídos de nossas rancorosas auréolas

E na delicada figura do cristo crucificado
o congelamos todos em um refrigerador moderno.

Dois Abutres


Multiplicai tumba adentro
vozes funerárias que cairão gritando...

Além de infâme, atenta ao apagão que em mim habita:
mendigando o parasita turvo com seus enigmas não revelados

Pulsarão em meus magros pertences as lombrigas e os furúnculos
orgulhosos ante este couro leitoso que pestilento jorra

E como manso animal a gozar rendido
faço de meu vestígio asqueroso e sepultado...

E abrigados nestes becos delgados
hão de fazer-me descer perdido nos intervalos bárbaros dos pavimentos

Deslumbradas por minhas chagas colonizadas nas entranhas
nos trópicos desfalecidos de meus rins gelados

Converto-me em regressos nos faróis oleosos dos cigarros
donde volta à terra de infância nas cortinas foscas de tempos estranhos

Ali pairo no acontecimento das mãos
em que cada dedo escava suplicante

O recém morto no embate de Deus e dois abutres
ambos a comentar suas façanhas

Enquanto meus membros destroçados
destrancam o fôlego quebrantado
no amargo ofício da vergonha.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Das Aberrações Milagrosas

Versos estacionados como dívidas pendentes
fazendo de mim o que lhe apetecem
criatura obscena em sua louca frigideira
alcançando o corpo que habito
numa verdade equívoca que agora chega à minha caverna
e por assim embriagantes latidos do imaginário
senti nos abismos enlouquecedores de minhas entranhas
a felicidade malcheirosa
da poesia resgatada em meus escombros.
Teu peito,
pedaço de terra vigiado,
em que minhas portas não fecharam
erguendo nos galhos dos teus pátios
minhas cicatrizes enxertadas de folhas...
Em teu dormitório as paredes ruíam
um pouco do cheiro da morte que agora pula por tua janela.

Cidade

Pelas bordas, abro as veias...
Em teu pescoço, correntes sanguineas bem movimentadas
Com seus meninos jogando bola a beira mar
E senhorinhas puritanas sentadas em grandes poltronas antigas
As mães amornando suas mamadeiras enquanto quase sempre seus bebês morrem...

Em todas as veias ruas imaginárias do mundo inteiro e
histórias traçadas com afinco no caos que de ti escorre
Suas partículas que crescem sem chuva
Num ritmo da dança de super-heroís reais
Volto pra teus coágulos deixados nas estações...

Encontro picos de insanidade
Nuvens cinzentas cruzam teus becos, tuas esquinas vermelhas...
Aos poucos, libertam-se de suas cavidades veículos envenenados
Aonde posso ver a nocividade nos olhos alheios
Findo-me. Sento-me à beira da saída. Corto as veias com mais verdade.

O Acordo

Apenas minha boca neste corpo apertado de saudades
A buscar um pouco de abraço dos teus braços graves e tristes...
E estes lábios descarnados a morder quem me beija
Na loucura humana da garganta
Das tuas pontes moribundas e redimidas
...

Tombo assim em teus olhos as mãos calejadas de sonhos
Noutras ilusões desmanchadas pelo tempo
Evaporando-me em álcool distante do verso sob as caravelas da taça de vinho
E ao beber-me de gole em gole
A boca silencia o acordo entre a desgraça e a sede.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Porque esta seria supostamente a minha língua roxa misturando os restos nas panelas para alimentar meus gatos. Este serei eu buscando um recanto longe da poesia e da coragem. Esta mão que vê agora é a minha abrindo mais oito feridas em teus braços. O sorriso que poderia chamar-se alegre é um desespero sufocado dentro da casa. Os meus braços já morreram demais para você tentar fazer um corte profundo na carne. Aqui mesmo, assumo: pessoas são pálidas e minha felicidade é a mais ignorante de todas. Acordar. Medo da morte e pensamentos em ruínas.
Um demônio e já sou homem, e este homem está cercado pela corda. Poderia agora eu morrer atropelado e passar a andar sozinho. Aqui, no meio da rua meu pênis decide morrer e lança por cima das coxas uma corda, a mesma corda que me cerca, o pênis morre e começa uma festa surreal, patética e leviana que nem mesmo o próprio Diabo iria deixar de participar. Após a morte quem anunciaria as coisas acontecidas que ninguém mais ousou dizer? Só eu.
Porque este suicídio rídiculo supostamente seria o meu, e o caótico assim como a inteligencia alimentam as vulgaridades que mais me interessam.
Dos cus às máquinas, do absurdo à crônica mais libertina de todas. Porque o teu e meu corpo estão na busca herege do suor, da ferrugem, do fogo e maldição.
Porque na vida, existem várias formas de dizer nossa pobreza, e eu sou o homem que abaixa na rua e estica as mãos grandes até o capim o levando a boca como se degustasse dos meus tristes olhos cegos.

Não espere eu te pedir que venha agora,porque nada se acaba, tudo pede passagem para outro movimento.

O Piano

Notas velhas levantaram ainda ontem suas mangas e calças. E todos os ouvidos unidos numa presença que sangrava o divino e as melodias trancadas numa garrafa corriam a casa repleta de lembranças. Os pés a dançar certos sabores flutuantes. E de tão súbito,a música fez-se presença
saindo daquela garrafa feito prisioneira antiga para abolir de todo a canção. O ritmo aflorado me beija ligeiro. O piano queima enquanto alheia, a melodia reedita-se. Dentro desta fúria haverá um concerto de gemidos implodidos. Os dedos do pianista ardem e mutilam-se, os dedos bailarinos percorrem sem som o vazio. Ao final do espetáculo, nas dobras do seu mundo, as notas defalecem num desfecho emocionado e o pianista de preto partilha com elas a canção num ninar quase sombrio onde partituras serão apenas desculpas.
Trapo raso que assumo. No que é vão, pesco teu batom de nuvens. É em teu sono que invento, pois teus dedos são como gansos e você retira todas as jóias.
Na tua falta, não era isso morrer?
Em ruídos construídos mastigava tuas memórias em absoluta resignação. Este será o tempo, mesmo dentro da tristeza, da emoção vazia deitando-se na cama. E se pudéssemos voltar à raiz das palavras eu lhe daria filhos e mostraria a primeira mordida de todas as frutas assustadas. E você me amaria nesta casca que carrego sempre comigo até nossos corpos nus assumirem o gosto do eco profundo neste formato sóbrio.

sábado, 26 de fevereiro de 2011



















Vestiu-se às duas e meia
No ponteiro apontava a arma acima do ámario
Vestiu-se dum calibre trinta e oito
Mirou-se no espelho
Atingiu em cheio a decência
Matou o amante ao se despir
Perdeu os dedos enquanto masturbava-se
Amputou sua dignidade perdida em desgraças de vinho
Acabaram-se as balas...
Foram-se os dedos
Perdeu o amante
Tingiu a boca descarnada dum fluxo sanguineo
Conduziu-se ao marido que a esperava angustiado
Deu-lhe um beijo sem saber da última bala no gatilho
Perfurou-lhe o maxilar, atingiu-lhe a cabeça e não haviam mais balas para matar-se...
Morreu a míngua em meses posteriores sem dedos ou boca para alimentar-se.
...
Morreu duma fome introspectiva voraz...



















Atingiu o dorço braçal
Leu uma, duas vezes sua poesia barata
Caprichou nas rimas
Escondeu os erros
Engoliu a seco
Regurgitou uma matéria salivante
Um pouco espumosa
Saíram duas estrofes incompletas, encruadas de nervos verbais
Descarnou do pouco que tinha
Faltou-lhe essência dialética
Não lucrou com nenhum poema
Inspirou-se na míngua prosopopéia de um insône criador
Bebeu do tédio salubre
Engasgou-se com o desfecho...
Nasceu para ser só, poeta intraduzível
Ignorante e imerso em sua própria arte
Filho dum processo criativo medonho
Mediocridade é seu nome
Passo sem retorno
Afluente das águas revoltas em si mesmo
Morreu Antonieta esfinge envolta em sangue
Sociopata em seus poemas
Sufocou de lisergia reconfortante



Morreu José para a poesia...

Sobre Insanidade






















Vestígio encruado em saldos positivos de mágoa e ódio tênue
Escárnio dum vermelho sangue
Apontando a arma do crime em direção ao lapso do vazio
Entre a fumaça espessa do cigarro,
Vi-me mendigo feito pedinte da banalidade poética
E da falta de um ócio criativo
Arranquei do corpo pêlo por pêlo, do poeta não sobrou-lhe nem os cabelos tingidos de mágoa loura
O inferno tem nome boca e labirintos...
Avistei penduradas nas portas camisetas molhadas dum suor vinho tinto safra 86
Finquei o vinho em panelas suicidas de horror
Animais faziam orgias enquanto perdia a serenidade na internet dos loucos desvairados
Estive insano, preso em Marte, num satélite momentaneamente em órbita
Serafins me levaram em caixas de crianças criadas em orfanatos desertos
Águas mostraram-me a profundidade do Seol
Até o momento em que com seus olhos sábios me tomaram pelos braços e conduziram a ponte entre a arma do ármario e o escudo
do final do quarto.
...
Morri de inanição de vida.

Eu era um verbo calado, contido na condição de ser outras partes de mim. Eu era caboclo, preto feio, ogro, cercado de burgueses gloriosos e bem vestidos.
Eu era menino imerso na profundidade de meus estragos. Destruição era minha imagem refletida no caos de minha nocividade.
Eu era o primeiro a desequilibrar na linha tênue de minha medíocre falta de humanidade.
Eu era a falta da presença. Oco e desprovido de fé.
Hoje eu era um verso inteiro de chuva, uma ponte ao contrário, um gatilho de invasão das cores, um quilombo repleto de escravos alforriados, uma imensidão de superlativos de sementes, a tua e a minha clareza em todas as palavras.