segunda-feira, 22 de abril de 2013

E eu já não tenho ideia do que fazer com os nós presos,talvez, eu faça mudar a corda,pinte de outras cores e coloque um titulo menos bobo. Ainda que, eu troque a música e escreva o poema de trás pra frente, será o seu corpo imerso nas estrofes. Será a sua boca fazendo coro quando eu abrir a porta, e os teus braços puxando a mesma corda. Daí, eu forço um espirro pra desentranhar teu cheiro do corredor, mas tenho memória poética e olfativa, o cheiro continuaria lá e eu, ainda mais estúpida. Pego um ônibus diferente, mastigo só do lado esquerdo da boca, troco todas as ordens da rotina e ainda assim, sua imagem retém nas mãos todas as cordas. Arranco das tuas mãos, tranço numa rede ou prendo no violão. Dele, som algum.Nada... 
Escolho outros livros, vou para o bar. Por baixo da mesa, um nó pequeno roça minhas mãos, o grosseiro tecido que o compõe é cheio de pretextos e todas as doses do mundo de você. Largo o copo, acendo um cigarro e lembro que você odeia que eu fume, apago, simulo um desmaio, prevejo um poema martelar noite adentro na cabeça.
Vou pra casa com o nó em um pulso e a corda no outro, abro a carteira, e teus brincos de pérola cintilam no opaco da noite -vou devolve-los em breve, prometo inutilmente. Em casa, tua voz continua a ressoar mansa, desta vez, mais serena e doce do que nas últimas. Agonia, crio um deus e uma solução falível. 
Escrevo uma crônica pra você, os nós desatam a cada linha, a corda vai puindo e a inspiração por hora entra em estado de inanição.
Adormeço. Amanhã, a corda continuará a refazer os nós de saudade.
Ainda será preciso,
desconversar os verbos
com um pouco mais da calma,
soprar devagarinho o que impulsionará
novas rotas,versos recém formados
da placenta de um outro dia
...
Projetar nas calçadas,
portinhas de saída,
submergir com pincéis 
mais delicados e,
esperar a poesia
afinar no tempo,
no meio de um feriado
ou no centro do furacão.

domingo, 21 de abril de 2013

Tenho um sono profundo sobre essas coisas soltas da vida que, não tem nada a ver com poesia. Uma preguiça de filas de banco,cartões magnéticos e da moça que me serve o café todas as manhãs. Bom mesmo, seria impregnar a sala de trabalho, o ônibus e todas as repartições públicas com o cheiro de hortelã e versos quentes. No lugar dos ternos, casacas bordadas pelas mãos de Rachel de Queiroz, ao invés de gravatas, cordinhas que puxassem um poema toda vez que a temperatura aumentasse. As filas de banco distribuiriam folhinhas com sonetos, ao invés de senhas, os cartões magnéticos passados nas máquinas alucinógenas, fariam imprimir dúzias de poemetos novíssimos e, a moça do café sorridente, me ofereceria um poema expresso de Adélia Prado ou Ana C.
As mulheres nas maternidades parindo verbos diriam orgulhosas: - Que linda esta minha filha! Se chamará Palavra!

E, ao chegarmos exaustos, inundados de tanto peso nas costas, abriríamos as gavetas dos armários abarrotadas das mãos de todos os poetas,vivos ou não.

E você pode vir buscar isto aqui? É que, tenho medo de me faltarem mãos, sobrarem desculpas e a coisa toda ficar aí, no meio da sala, estrebuchando de tanta graça e poesia. A inspiração dá medo, sabia? Quando a gente olha colada no pé da mesa, aquela estrofe inteira,imponente de tantos eus líricos, que a gente não sabe onde começa o poema e termina a música. Sai pra pegar um café na cozinha, e a cafeteira transborda a xícara de Leminski,abre o jornal de domingo e, todas as páginas são de Hilda Hilst gargalhando uns sons lisérgicos de prosa. Vou pra rua e, todos os passantes sussurram versinhos cantados, aquele friozinho na barriga,borboletando o dia de lirismo. Um poeta a cada esquina e o cotidiano inflando a arte de azul.
Assumo o risco da função, abro o livro do poeta, leio teu amor apertadinho que me sorria no canto da folha.

Levocardia

Teu coração bombeava o que há dias estava impregnado nos pulmões,
risco de vida, pericárdio molhando os travesseiros,
câmaras secretas abrindo-se de versos e cerveja barata,
os ventrículos debochavam dos órgãos que nos sobrevoavam como aves de rapina,
átrios inteiros peregrinavam nos corredores da válvula mitral,
nossos sussurros fazendo eco nas cavas adoentadas.

Manda chamar alguém que tenha as chaves da tua caixa torácica!
Olhem essas artérias! Fininhas de tanto medo!

O sangue contraindo os filetes de perdão, desaprendeu
a fazer ponte para o que já foi oxigenado,
organismo empobrecido de vazio
...
Apenas uma poeirinha debaixo do amargo órgão, alimentando as batidas.

domingo, 14 de abril de 2013

Sobre Cecília

E você chega, estonteante, coberta das suas miudezas que deixam o verbo mais delicado. O cheirinho adocicado impregnando de calor a sala, de voz mansa, acarinhando minhas células ciliadas. Quando te tenho nos braços, memorizo os próximos poemas que virão. -Não posso perder nenhum detalhe. Cada beijo, um verso anotado, tuas mãos nas minhas e já fiz um haicai,tuas coxas entrelaçadas nas horas que saltam de tanta pressa, e já tenho pronta uma estrofe inteira. Vou dedilhando pequenas possibilidades a cada informação que tua boca fala. (Tua boca não me disse, mas já sei soprar tua nuca só pra te ver reagir de encanto em um punho e vontade no outro).
Minhas mãos perambulando atentamente em cada pedaço de enigma que emana do teu corpo e assim faço a primeira crônica, mais um pouco, beijando teu colo, encostando meus segredos nos teus, quase vejo um soneto caindo dos teus cachinhos, talvez, uma prosa brotando no meio das costas que tuas unhas cravam. Veja bem Cecília, o líquido agora é um poemeto, sem rimas ou métricas, porque amar assim, não nos permite tempo, exige mesmo é reza baixinha, pra correr tudo bem,pra desafogar de mágoa quem está lá fora, e sobrar apenas o que a gente puder declamar no emaranhado das nossas roupas e lençóis. Quando terminamos,já tenho prosa,crônica e poesia, de tanto olhar você, tenho mantimentos suficientes para gerar versos por dias e dias a fio.
...

( E você chega... Cecília).



Acróstico

Impregnado coro,
Libertário e mentolado na xícara flutuante,
Umbigos festejando a poesia viva
Somos todos verbos alucinados!
Intencionando as estrofes com sonoridade,
Organizando as fatias do caótico verso.
Navios ancorados de "insPIRAÇÂO"
Integrando marolinhas poéticas da rotina,
Segregando o acinzentado das telas,
Teimosamente acendendo o barato da arte
Amadores das letras: inveterados!
Somando nossos pedacinhos úmidos de estrofes

Desapropriados de métricas,
Onomatopeias de carne e prosa

Variando os ponteiros do poeta,
Enquanto o domingo engole nossas páginas
Ranger das portas que abrimos para
Buscarmos novas ideias
Oscilando o poema de arte e sonhos.


Esquecemos de seguir,
desprender a língua da garganta,
beber a pinga no gargalo da ferida
("águardendo" nos poros subaquáticos da vida)
...
 Você esqueceu o caminho.
No mapa, duas fotos cuidadosamente guardadas na mochila,
tuas rotas envelhecidas de desgaste,
e o sangue pisado nos teus pés magrinhos de medo
dilatavam com a luxação das palavras que pronunciamos.

Era pra ser toda vida Maria,
perdi o verbo para Sofia,
inversão de casas,
volto pra dentro do perdão uterino,
tua mágoa dissecando com crueldade
meus restos soltos pelos cômodos.

Não culpo tua hóstia, nem a cruz.
Aceito, engulo e confesso todos os pronomes,
cada espasmo alcançado nas retinas
até que voltes pra dentro das veias: Maria.

Sobre terremotos, beijos e Cecília


Um abalo sísmico,
quatro mãos tectônicas no caos,
hipocentro de estrofes,
epicentro de beijos no Haiti

Tua areia formando a casa,
castelo de pernas convulsas...
Freio teu relógio,
tua língua avulsa em meu ponteiro de horas
...
Pedaço litosférico do que virá.