sábado, 5 de março de 2016

Na roseira

Tua flor, no divino jardim,
no canteiro, sem vaso,
em meio a calçada
já que do asfalto
nasce a cura

Tua flor que é minha reza,
o ato religioso,
um milagre
da fé que expulsa 
o que é frio e certinho
sendo torta e fresca

Tua flor que minha também é
despedaça o vermelho
e tinge tudo de azul-
o moço te pintou
te vendeu pra um casal,
pra flor
florir no quintal

Era meu pai

Ontem, vi uma borboleta negra,
era meu pai.
Na estampa de suas asas,
tinha uma letra da velha canção
(que um dia você cantarolou andando pela casa)
amanhã te verei colorido
suas asas me aninharão
voaremos juntos pelo quintal
você pousará nos meus dedos
Não terei mais medo da imensidão.

Canhão de flor

Gostaria de atravessar a casa, a rua,
o tempo e o canhão de flor.
Rasgar essa folha
pendurar na parede,
no cabide,
no espelho,
desdobrar as roupas,
jogar no chão e deitar...
Me embrulhar,emaranhar nos fios de cabelo,
de linho,
e de alta tensão

Onde se esconde aquele pedaço
de flor, de bolo, de juventude?
Onde eu vim parar?
O dia está tão estranho...
Azia, fúria, cansaço,
formigamento, falta de cor.

(Começou a chover, na casa, há um rio inteiro de mim).
https://www.youtube.com/watch?v=9yJWntQYMQI

Quebrar o copo

Não me acostumo com esse estado de vazio. Com o dia que amanhece sem nada a dizer. Com um copo que é apenas pra beber, com a literal função das coisas.
Eu quero é desconstruir! Quebrar o copo, e fazer dele um mundo de finalidades. Me deixem tentar ver o mundo com a alucinada lupa poética! Não me coloquem quieta, de oito às cinco em uma gaiola. Me libertem! Eu quero fugir da normalidade frígida, quero me salvar desses goles pequenos, dos rumos escolhidos com pautas. Quero endoidecer pra descobrir o que é lucidez, perder a esperança pra gerar fé, perder o estado de poesia para poetizar esse cotidiano limitado e pálido.
https://www.youtube.com/watch?v=5fJ_Qj-weTE

O poema quer gritar

Querem me tolir,
fazer calar a voz dos meus versos.
Me querem no canto da sala,
amuada,
envelhecida.

Meu poema quer gritar!
Em repúdio,
em revolta.
Minhas palavras querem guerra!
Não vou sufocar a inspiração
 (Não posso)
Estou munida de arte, fúria e imaginação
Quero a febre e o ruído
Luz acesa,pólvora e música

Saia do meu caminho!
A poesia é meu automóvel-
Minha bandeira e comida
Sopra recomeço no epicentro da ferida
...

Cabo de guerra

Estou desperdiçando vida-
Deus me deu tamanha imaginação
e um corpo tão cansado.
Tento alinhar os dois
Resgatar a paz entre os dois
Mas, não há acordos,
ambos são geniosos...
Quando dou conta,
formaram novo cabo de guerra
(Cão e gato)
Gostaria de selar um acordo-
Mas, me vem sempre o paradoxo:
Poetisa impotente
Água e óleo nadando na corrente.

sábado, 9 de janeiro de 2016

Sobre nós

Gosto quando deitamos e confundimos as músicas com nossas próprias histórias. E enquanto toda a gente lá fora se debate em suas rotinas, ficamos no quarto, dentro de um poema ou música,num carinho que carece morada e só cabe nós dois. 
Gosto da descarga elétrica sutil que nos invade no meio de um beijo ou cafuné, um choque igualando os corpos na mesma sintonia. Por isso, fico. E gosto cada dia mais do emaranhado de fios que começamos e tecer, carinho amalucado que alterna dengo com tapas. (Risos)
Fico porque vejo que ainda conseguimos encontrar no pior momento de nossas vidas a calmaria de estar começando a caminhar ao lado de quem nos quer bem. 
Repara bem no que digo:
Fico. Que é pra construir afeto, que é pra aprender a esquecer aqueles que um dia nos fizeram tão mal. Estendo sob tuas pernas uma ponte. (Por isso, passa pro lado de cá da vida). Cobre de paz e recomeço tuas mãos e entrelaça nas minhas. (Há muito além de nossos corpos enfraquecidos pelos beliscões doídos de amores passados).
Assim, inauguramos os ventos que nos impulsionarão como nuvem. Sem amarras, medos ou culpas, voamos...Livres e sempre adiante. 



sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Oração ao centenário

Brincamos no pedaço centenário de vida, teus tumores abrindo flores e a mão do vento emaranhada em minha culpa...

Teus restos chovendo no meu quintal, tua velhice orgulhosa dos pés de frutas e serviços de carpintaria, minhas mãos penteiam teus grisalhos fios de meu respeito e amor. A vida minguando tua saúde, tua ferrugem nos brinquedos do parquinho, e tua areia soprando nossa rua aos soluços - Cupins camuflados de morte, mascarados de fragilidade e final rondam a casa, mas entre os muros e os medos você sobrevive, tua natureza sábia é dona de uma espada transparente para que a poesia flutue em nossa esperança. Deus ecoa nos teus anos de vida, nas gavetas de filhos e netos dos teus versos de um dia.

A vida prossegue na cria dos teus ossos encantados, nas dobraduras da tua herança, existimos: amor.












Ao meu avô: Queiroz.

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013



Desaguamos no olho do medo
Teu olho no meu (– olho do furacão)
Embarcamos no devaneio florido
Mastros controlados por nossos gemidos
Tecidos nas velas pingando no leito em que deitas
E no leito do Rio de Janeiro
...
À deriva, impedimos o poema de naufragar
No meio de tantas águas das tuas lágrimas salgadas
Que nesta sala formaram um mar.




Regresso aos veleiros ancorados nos espaços de nossas falas. Em dezembro, proclamamos nossos versos na soltura dos vestidos, no sanfoneiro barulhinho dos dentes a se expandirem e abrilhantarem nos pratos lustrados dum sorriso. Um copo de café, a falta que o cigarro faz, a tarde aquecida da fumaça imaginária do verão na contramão. O nevoeiro por cima do abismo que os próprios passos provocam. (Olhar esperançoso de hortelã).
Veja bem Cecília, o poema está embaralhado nas páginas do livro que teus dedos passam e na fumaça que salta da minha boca “atabacando” o quarto com tua fúria compenetrada em meus vícios rareados. Labaredas nas tuas marés, minha droga nas tuas veias, um rio de orgasmos a coagular nos teus seios, e o suor a pingar no conta-gotas dos teus olhos juvenis.
No cotidiano do poeta, nascem flores e capim fresco. O quintal está repleto de chuva e o abacateiro tem gerado grandes acerolas doces que pescamos com nossos beijos de jujuba e amendoim. A casa da frente é verde, e nosso jardim lilás, feito os vaga-lumes que nos aparecem somente durante o dia.  Entenda que estes são os nossos pertences que carregaremos em nossa tenda toda vez que amanhecermos juntas. 


sábado, 23 de novembro de 2013

Na rua Silva Cardoso, lastro de malabares reluzentes na chuva. Silvia é dona dos bondes, dos botecos e das calçadas portuguesas do subúrbio carioca. Os seios céticos simbolizam a sintonia entre os astros e os mastros dos marinheiros em suas ondas pélvicas. A boca pinga de trovões os pontos de ônibus, as máquinas das fábricas e os restaurantes lotados de sábado. Silvia me enche os pulmões de um bairro com apenas três ruas, as vias de Silvia são de asfalto e saliva lubrificando o trânsito e sua voz rouca. Em meus dedos, a digital inflamada dos segredos de Silvia. Já não há embaraços nos traços de uma tarde em novembro.

domingo, 22 de setembro de 2013

Desandamos a chorar. Setembro tem dessas coisas que a vida não sabe aproveitar, como naquela tarde em que a calçada abriu pros nossos pés juntinhos passarem e arrastarem com a poeira saltando das solas todos os verbos que o chão ia declamando nas notas da canção. Não esqueça de anotar- a gente vai passando embolado nas lembranças, um pouco perdidos, um tanto desajeitados e fragmentados, mas a poesia emerge de um estado caótico e milagreiro, os versos sabem invadir os silêncios mais oblíquos e nossos encantos vão transbordando em nossas invenções travessas. Espantamos e descaramos o medo- entidade exibida, setas e o êxito esvaindo-me em versos agudos. Cerejeiras procriando em meu endereço, o ontem deitado em um caixão de ternura, signos sem culpas, estendendo os olhos nas reticencias da arte. Minha imaginação dona do mundo me olha de dentro com esperança, inscreve meu nome no ponto de partida. Bons presságios- vibrações nos esboços, nos mapas que a cabeça dança, nas asas contorcionistas que a inspiração escreve. 


quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Coloca o poema pra deitar,
deita junto do poema...
Carrega o poema nos braços,
cai nos braços do poema...
Enxerga o beijo mentolado do poema,
dança o poema e canta o som que ele faz...
Desfaz o poema e se  reconstrói,novo...
Coberto das cobertas de encanto da esperança dele.

Escuta o beijo que o poema faz...

Nossos versos teimam em interromper a realidade,
nossos corpos insistem em querer tanto
e as bocas só sabem falar depois do beijo,
e a vida recomeça no instante em que nos beijamos outra vez...
Descontinuamos de onde paramos e tornarmos a entornar os corpos
e a entortar os passos,
e estes teus traços que o batom contorna nos lábios do poema que eu volto a beijar

...
Toquei um poema baixinho,
teu ouvido me sorriu melodia de vida...

Vi um poema no cisco do teu olho,
deixa eu soprar.

domingo, 1 de setembro de 2013

Primaverando

Acho que vi um pedacinho da asa de borboleta estampada na tua camisa, naquele momento em que teus braços esticaram nos meus ombros e expandiram em coloridos que grudaram até o caminho da minha nuca. Depois, vi duas borboletas saindo de dentro da taça de vinho, o líquido tingia nossas bocas de poesia e sotaques de primavera. 


domingo, 18 de agosto de 2013

Resgato o gosto fresco na ponta do cais. O sabor ruivo dos próprios a/pelos. Cortinado de água salgada na vista turva, expelimos recomeço nos poros aquáticos do verbo. Meus pedacinhos de poesia reencaixando nos naipes do jogo... (Fique uma rodada sem brincar).
O poeta, com suas serpentinas, fez-me um vestido de carnaval. (Carnavalizando o sumo de à/gosto).Estou para com a liberdade,assim como o poema esta para com a inspiração lisérgica da vida. Tenho nas mãos agora, a cartilha e o carvão,no momento exato de vislumbrar as letras todas acomodando-se em suas cadeirinhas acolchoadas,por dentro, espumas e plumas, por fora: cetim. Acho que, se você dançasse, a chuva despencaria das nuvens direto para seu quintal, e os versos formariam pocinhas de poemas umedecidos de jovialidade e ternura.Do ângulo da felicidade, estou do lado de cá,e vou de encontro ao coro ninado até que, os versos todos fiquem azuis. (A felicidade é uma fotografia em tom azul). 
Por dentro da bússola, magnetismo do que virá. Pontinhos cardeais abrindo poesias e sorrisos. 

"...A felicidade é como a gota de orvalho numa pétala de flor..."


quarta-feira, 10 de julho de 2013

Vinil 1.977

Eu fico. Em meio a desordem programada pelo recado que você deixa diariamente na caixa de mensagem. Outros tons,você disse, mas o recado sempre deixa a cor rubra, um tom de sépia que teimo em apagar no frio dessa noite. Um bar, duas putas passantes e a verdade queimando naquilo que esquecemos de falar. Você dissonante e eu meio bêbada. Nos prestamos ao papel de mensageiros,somos libertinos no subúrbio, ainda fazemos meio e final. Expelimos casas abertas,janelas sem cortina e a música de um vinil de 1.977. Olho pro pulso, e a pulseira reflete na luz fosca do banheiro. Essa tonalidade deixa o adereço embaçado e delirante no fundo verde musgo da parede. Todos os detalhes decorados e camuflados na tua imagem que passo em um piscar de olhos, eu fecho as pálpebras e, você nasce gigante no cinza da canção. Melodia manhosa do que ficou por vir e ainda estará preso nos cílios... Gigantes desdobramentos da calçada portuguesa. Prepotente musgo que quebra todas as encostas das suas costas fechadas por um santo qualquer. Eu leio Bocage porque teus olhos refletem um Portugal mais entranhado no que em mim é só um Rio carioca. Acho que fiz um poema e deixei solto no porta-luvas, naquela hora em que a melodia não soube dizer a velocidade da estrada coberta de nevoeiro. Acho que sou mesmo menina, e não sei bem a hora em que termina a queimação estomacal que essa presença tão nossa, deixou arder na carteira de identidade que o moço pede ao nos ver entrar nos becos delgados de quarta-feira. Eu sou um artifício levado que teu andar não soube parar o número certo do elevador, e você um chaveiro que minhas portas erram toda vez em que abro a porta. Somos um erro. Somos um erro. Somos um erro. Que teimamos em atirar na engrenagem da bala a queima roupa. Não me peça mais pra escrever pra você, o poema sempre se transforma em crônica e os medos sempre convergem nessa falta de argumentos. Sou amadora das tuas rimas, sou leviana com meus princípios que principiam na tua coroa de desejo, e abre...Abre... Poltrona de reis cegos no olho da manhã que nunca chega para nós. Fotografo então, tuas mãos compenetradas em minha arte, e o santo descarrega o milagre, o ato de um rito, nosso batismo líquido em meu deserto de amar.
Você, desordem programada em meio ao caos. Mas o recado sempre deixa a cor rubra...Um tom de sépia que teimo em "pagar" no frio dessa noite.

sábado, 22 de junho de 2013

Antes de partir, separo o tom exato, o vestido mais florido e a medida certa de poema- Poesia demais tonteia a gente, e quando deixamos faltar os versos, não conseguimos voltar de onde viemos. Talvez, seja mesmo hoje o marco zero, o início da nova estrofe. Poemeto: que é pra recomeçar pequenininho e inaugurar a vida de encanto e vontade. Escuta bem: Estou segurando a tua mão( veja bem se não solta a minha) e estou colocando a flor numa caixinha de música que é pra saudade não sufocar os pulmões do esquecimento perpétuo. Estou voltando pra pegar o verbo que deixei nas tuas mãos e recolocar na minha poesia, separei dois pincéis: um teu e outro meu(Veja bem se as cores vão valer o esforço: eu pinto o branco de amarelo e você, com o mesmo tom de azul).Você cresceu tanto, que nem sei o que fizeram dos muros.Vá devagar- as palavras estão todas emboladas nessa confusão da vida, e eu já nem sei formar delas uma frase sequer, mas agora estou com as mãos nas tuas (veja bem se não solta minhas mãos que tremem tanto na tua presença). Na medida certa do poema: Estou voltando pra pegar nosso verbo.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Lupa do avesso
envergando o projétil,
impulso carregado de um calibre maduro,
cartucho de saliva no silencio 
metal gelado (língua no disparo)
segredo na capsula 
tambor repleto do desejo
onde balas gozadas atiram-se em nossas roupas
(rasgam,perfuram)
os botões aflitos jogam-se no chão
tua blusa, meu vestido; caídos, convulsos 
as coxas entrelaçadas no tiroteio
Calibre trinta e oito...
Meus vinte e cinco poemas na tua mira
Calmaria...
Sangue coagulando no lençol.
A paz merecida depois de toda guerra. 


quarta-feira, 5 de junho de 2013

Explodem nas vias nucleares
eclodem moléculas, trajeto no tempo/espaço
estampido de pólvora, rajada de versos na velocidade do som
ruído térmico nas duas luas da tarde

Eu tombo, marco zero em seu núcleo atômico,
este poema mais gravitacional do que nunca
a inspiração dentro da máquina aceleradora de partículas

Multiversos 
Massas em expansão
Nebulosas em sua forma inicial

O corpo amuado em sua condição de pequenino
um Deus cósmico estende o punho,
atravessa a atmosfera do poeta,
engole a arte com irradiação

 A poesia embrutece na poeira dos anos
misturando-se em uma nuvem molecular
nucleossíntese de palavras (papel e caneta nas mãos e não nos corromperemos)
migração de planetas e motivos para escrever

Construção do sistema solar
construam o verbo na gigante vermelha
hidrogênio e hélio  na hélice de um ventilador
soprem o poema na fusão

Corpos celestes(satélites de medo).


quarta-feira, 29 de maio de 2013

Eu corro para escrever. Escrevo tanto sobre o que habita, sobre o que ainda poderá vir. Eu tenho medo, você me toma como menina. Nunca escrevi tanto, se fossem os anos antigos, não saberia dizer do refluxo que viria. Entopem todas as passagens. E eu quero. Agora? Tarde talvez? Não sabemos, temos todos os sorrisos, você está em todas as palavras. Sou outra vez foliã. Me prendo no que você diz sentir...E começo a sentir também. Tenho vinte anos de novo. Tenho todas as perguntas, você contorna de música.
Terno. Terno. Meu.

Minhas favoritas, amarelas e com cheiro de versos guardados na última gaveta com tanto carinho. Fico. Tua presença ainda me causa o mesmo emaranhado de anos passados. Você aprendeu a escrever e minha poesia só sabe do encantamento que tua fala evoca. Estou tão dispersa, nem sei denominar este novo tempo. Do que sei, gosto mais de filosofia do que nunca... Mais de dias da semana e de café com Neruda.



terça-feira, 28 de maio de 2013

Volto a ser menina.Estudante aplicada em tuas frações.Passo a gostar mais de terças. Gosto cada dia mais das sete horas, do cheiro de perfume amadeirado e de Sartre. Gosto mais de Paulinho da Viola e Luiz Melodia. Gosto mais da chuva e da temperatura do outono carioca. Esqueço a poesia, danço com crônica.


Tua mão em minha folha. Escrevo em você.Último olhar.
(Nossas mentiras fingindo acreditar)
Outro verso. Outro lugar.
Velhos demais e o novo explodindo
no canto da boca (o canto dessa tua)
Vício.Vício.[Cio]
Tuas sondas em minha expressão corporal
(Qual o nome dessa doença?)
Na tela o aviso: Mais e mais de você expandindo
Sodoma e Gomorra virtual.
Último dia. Burlo os ponteiros,
você arranca o relógio do pulso.
Cor(rompemos).


domingo, 26 de maio de 2013

Dueto com: Paulo Alonso


Brisa
Um tom maduro
Na candura, avisa
Que a idade quis a
Altura da queda
Do muro
...
Sopro
Cores em sépia
Tuas folhas caindo
De março a junho
Jacarandá desfalecendo no grito,
Absurdo botânico no meio do quintal
...
Vendaval
qual carrega as folhas
ex-verdes da estação passada.
Deixadas pelos galhos,
mas agora colhem frutos
mais astutos
após o carnaval
...
Serpentinas deitadas sob o amarelo das folhas.
Dos seios das árvores de tua estação,
Escorrem atmosferas elétricas.
Temperatura mística, polens nos túmulos,
Outono grávido de raízes e flores secas.
...
Era festa
Que morre em vida
São as cores mais decaídas
Em direção às cinzas (do frio) do inverno
Esta gravidez de plenas colheitas
fecunda pela fértil brisa
Tornam este Outono,
Materno.

O problema nunca foi a culpa, nem as desculpas. A fonte de toda inanição sempre foi o exílio.  A fome do outro no outro. Os copos cheios enquanto a saudade esvazia o peito. Esse pequeno cercado que compõe os limites que me impuseram. O problema nunca foi teu afago, tua aproximação. Já não existem territórios ou passeatas, apenas um tremor que começa na ponta dos dedos do pé esquerdo e percorre até os cabelinhos soltos da nuca. Tua ausência foi por minha escolha, e tua presença tem-se feito em desorientado memorial do que ficou por vir. Insisto. O problema foi quando comecei um poema torto que se curva diante dos seus grandes olhos de menina. Foi quando prendi tuas mãos nas minhas e não soube decodificar os sons de aviso. (- Muito cuidado... Poesia não se embrulha em papel riscado).
Daí, um dia, me vem solta na pedra a resolução hermética do sistema: Tirar das compotas porções generosas de nós e entregar nos braços de um frade, um padre, um carteiro que abençoe nossas vontades enclausuradas dentro de uma fábrica de tecidos. Separo dois metros de seda, envolvo nos teus seios e cintura. Guardo um pouco para que teus dedos sintam a paz de meu afeto.
(Um dia, ela me pediu que lhe prometesse algo. Tua dúvida e meu silencio. Guardo todas as promessas numa caixa rasa, camuflada de poemas e algodão fresco).
Aquieta tua imaturidade Cecília, amor não acaba nas frestas de um dia, ainda que o dia amanheça nos lençóis de algum outro. Teu amor me prende sem nenhum fio, sem que exista pavor. Teu amor me veio no súbito de um delito, mas permanece intacto nos vãos de cada dia.

“Amor de reza baixinha... Que é pra correr tudo bem... “

Memória fraca e ainda assim, todos os motivos para ficar, decorados com devoção e paciência. Sossega esse medo que salta por trás do teu ombro, não haverá desistência. Amor maduro perdura nas dobras do alvoroço que do lado de cá, passo.

“Construí uma estufa azul no meio do quintal.”

Sobre Cecília no pedaço azul da vista:

Te amo encarnada de prosa poética sem você nunca ter aprendido a escrever um só verso. Ainda amo, vestida do castanho que cintila no teu olho e do mesmo tom que embrulha de graça teus cachinhos. A tua força nas ruas, engajamento libertário da tua juventude que lateja dentro da flor. Amo tua melodia que inaugura meus ouvidos de encantamento a todo o momento.  Amo o que emana dos teus conflitos, tua doçura na fragilidade de um arsenal de guerra. Teus paradoxos de pequenina esbarrando e curando meus paradigmas envelhecidos. Amo teus trejeitos tímidos em meus pedaços já tão embrutecidos pelo desgaste. Teu amor remoça minha crença em poesias mais vibrantes.

“Cecília: enredo de cura.”


Por fim, apenas o nosso começo no final da folha.
Da tua barba o cheiro de uma saudade camuflada em minhas pequenas argumentações. O cheiro antigo de um mago terno. Escrevo um “C” nas minhas coxas, você o vem buscar.
É teu, de tuas mãos, ordem e posse. (Pega.)
Desabotoado de calendários, os botões estiram-se no chão, os botões partem-se feito fruta de temporada, alongam-se em nossas costas arranhadas de sal. Teu líquido marítimo deságua em meus pequenos beijos, e a saliva temperando de veneno as línguas desavisadas.
Minhas gavetas desmembrando o que enterramos nas folhas enquanto os corpos confundem-se nas ondas do Guandu.
Meu mago terno me pede um poema, escrevo em minha nuca todas as linhas.
...

(O poema está em tuas mãos.Pega.)

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Carta para Maria/Sofia


Nunca imaginei que casamento fosse tão devastador, como aquele pó mágico que cai da aliança, feito neve, por cima de toda cama, congelando membros e todo resquício de ternura. Um dia, todos os sonhos do mundo, noutro, transformação. Não havendo vítimas ou vilões, apenas a sensação adormecida do que tuas mãos me causaram. Mãos que alimentaram dias grandiosos e hoje perpetuam o caos. Nossas prisões vencidas perdem o frescor de revolução. (E eu te peço, me deixe ir.)
Tantas vezes te fiz Maria, e te quis inserida em meu futuro com a fé inabalável de que seríamos o sempre e “incondicionais”.
Minha vida inteira desordenada no controle de teu ciúme e a fé diluída nos frascos da tua estupidez. 
Vestido para mim, véu para você,alianças, nossa casinha, nosso sim mútuo e a entrega...
Aquele dia em que às seis e meia da manhã te recebi ainda meio sonolenta, com a notícia de que você vinha pra ficar. Minha vontade tombada no desejo de que fosse realmente assim... Meu mundo alcançando teu enigma de paixão. Noutro, os primeiros planos concretizados em nosso singelo cotidiano. Você de bermuda e candura circulando por todos os cômodos, eu, protegendo teus temores com poesia.
Nossa casinha: tijolo por tijolo, fruto de melodia. Tantas indagações e o amor fragmentando em nosso espaço. Tua frieza, meu afastamento, e meu desvio:(Assumo ter alimentado antes de tudo teu pavor enfurecido) o fim de todas as coisas em nós.
Não legitimo tua, ou minha culpa, erramos juntas. Pago diariamente meus pecados com tua fúria. Já não conheço teus olhos. Tenho medo que me peça pra ficar. Tenho medo do que você se tornou...(Por isso, me deixe ir.)
Amar nunca foi com um cordão umbilical ou posses, amar é inaugurar o outro de afeto todos os dias. Amar é o frio na barriga que um dia você também já sentiu ao ver que o outro se aproxima, aquelas borboletas todas voando nos devaneios da tua cabeça noite adentro, só de imaginar o outro tão bonito dormindo.Amar é perder a conta das vezes que já se viu ao lado da outra pessoa, e de quantas vezes a poesia ou canção pareceu tão mais convincente diante daquela emoção tão particular. Dá vontade de assinar a autoria de todas as músicas de Buarque, roubar descaradamente suas composições e  dedicá-las ao que sente. Ceder à xícara de café, ceder à vez, ceder à razão. E quanto tempo tem desde a última vez? Cortesia, carinho sem propósito de sexo, a delicadeza e o romantismo que fizeram eu me apaixonar? Perdidos nas frestas do teu ego e mágoa! (Preciso ir.)
Empatia: Tuas cordas no meu pescoço Sofia. Você esqueceu a grande lacuna entre apoiar e me sufocar. Amar é aquela coisa chamada: deixar ir... Lembra?
Amar é aquilo que fazíamos deitadas no chão do quarto, com guarda-chuva em punho porque o teto tinha goteira, ou quando perdi meu avô e sua coragem me resgatou de tanta tristeza, daquela vez em que confiamos os segredos de nossas vidas tão doídas uma a outra e desabamos de chorar por alívio, ver na outra a certeza de companheirismo e amizade permanente. E, você sempre será a pessoa que conhece meus sentidos mais a fundo, minha grande companheira, minha melhor amiga.(Você sabe que tenho que ir.)
Então, abrimos mão do beijo, sexo no sexo, mas, o que é isso diante do amor que sempre teremos? Pele com pele é coisa tão pequenina se comparado com nossas emoções imersas em afeto. Meu amor é rochedo. “Nunca deixo de amar quem um dia começo a amar” – Lembra? (Não deixarei de amar nunca, juro.)
Daí, depois de tanto amor, tanta paixão, tanta vontade... Veio a distância, o medo, a mágoa, a frieza e rancor. Olhar dentro do olho de alguém que você jura conhecer tão bem e enxergar só vazio.
Respiro fundo, deixo pra trás todo abismo que formamos na sala, deixo pra trás todos os poemas dedicados um dia a você... Nem Maria ou Sofia, apenas mulher.
Nosso amor outra vez no ponto de partida, inauguramos a palavra fraternidade. Zeramos nossos demônios e nos orgulhamos de nossas doces vitórias.
(Me deixe ir.)

Amo você. 
(sueda).

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Dueto com: Almi Junior


Eu vi um sol enorme
Queimar seu nome

No asfalto do centro

Os pneus choravam a sua ilusão

E eram levemente acariciados pelo vento

A sua voz some

Ao entardecer

Eu vejo a sua imagem crescer

Nos poros da cidade

...
Eu vi um encontro ungido
resfriar teus versos jorrados.

E nas calçadas emudecidas,

dos teus olhos estancados de chuva,

dopar uma saudade amplificada

por tuas mãos desalinhadas...

(teu verso em terra azul gritava
as letras presas na calçada...)

...
Eu caí num vão
Entre o seu calor em pessoa

Espaço onde a minha frieza voa

Atrás dos seus passos

Perfurando o chão

Seu perfume impregnado nos canteiros

As flores que nascem nos bueiros

Um bar com o seu nome
  Você se move na minha corrente sanguínea                             
Não existe linha reta pro teu caminho

Seu perfume no trajeto incerto

(Seu suor tem sabor de vinho)

...
Traduzo teus contornos com raro brilho
Inundação da tua saliva em meu verso de língua
Descubro então, o calor nas ladeiras de um beijo
Onde tuas partículas enroscam-se em meu satélite.
Teu dragão suspenso em meu desconhecido
Faz mistério nos mergulhos.
Vou-me de barco nas tuas veias apertadas
Orientando-me nos mapas dos teus ossos tomados de corte
A placa do bar grita nua,
Quer projetar asas nas tuas costas.
Nossos restos misturados como pequeninos órfãos,
Movimentam os verbos telepaticamente.